Ele estava sentado no gramado da casa dos
Ramos, quando Eliana se aproximou furtivamente; a filha de Adalberto tinha
acabado de chegar do Brasil, Rio de Janeiro, para onde o próprio Alam desejava
voltar logo que resolvesse o que fazer da vida. Ela era uma mulher pouco mais
nova que Alam, e para surpresa dele, era muito mais bonita do que imaginou.
_ Já ouvi você chegando, pode se mostrar._
falou o rapaz num tom baixo.
A moça se chegou e sentou ao lado dele, trazia uma xícara de chocolate quente nas mãos. Minutos antes quando ainda estavam dentro da casa onde estava sendo realizada
uma pequena festividade de boas vindas com a presença dos amigos mais chegados
da família; Alam e Eliana haviam trocado alguns olhares, mas como ele ainda
sentia-se um tanto confuso resolveu sair da casa e sentou no quintal para
admirar o princípio da noite.
_ Meu pai fala muito de você._ começou ela
tentando puxar conversa._ Faz tempo que não o vejo assim.
Alam ficou um tanto encabulado e evitava
olhar a jovem nos olhos, devia estar ficando mentalmente fraco, nunca tivera esse
sentimento em toda a vida.
Eliana continuou:
_ Então você foi um bruxo?
Ele se assustou com a pergunta seca
proferida pela jovem, mas mesmo assim respondeu tentando sair pela tangente:
_Eu era um Mago.
_ E qual é a diferença? _insistiu ela
tentando prová-lo.
_ Já não sei mais.
_ Meu pai me contou sobre você e eu achei
bastante interessante.
_ Seu pai salvou minha vida no rio e
depois mostrou o DEUS que me resgatou da morte para a vida. Agora eu passo os
dias tentando entender o que devo fazer e pensando em como vou me desvencilhar
de certas coisas.
Ambos ficaram calados por alguns minutos,
mas ao contrário do que podia ser, o silêncio não foi constrangedor e sim
confortável.
_ Como está o Brasil? O Rio de Janeiro?_
agora era Alam quem tentava puxar conversa.
Eliana sorriu enquanto amarrava os cabelos
negros.
_ O Rio é aquilo de sempre, uma cidade
maravilhosa, mas que tem problemas gigantescos, e a vida vai tratando de
encaminhar as coisas por lá; resolvi dar um tempo, mas vou voltar pra lá em
breve. Meu pai já estava me chamando para passar uns dias aqui com ele faz um
bom tempo e minha mãe estava quase indo me visitar mesmo, então aproveitei
minhas férias e vim.
_ Faz tempo que não viajo, também pretendo
voltar para o Rio.
Ambos riram.
Alam não acreditava, afinal sua vida
corria perigo com Donovam e Phyros tramando algo contra ele, sem falar em
Cortez tentando fazer de tudo aquilo uma forma de alcançar fama e mais
prestígio; mas não conseguia pensar em mais nada que não fosse a face de Eliana
a qual ele não tinha coragem de encarar frente a frente. Ele via no rosto dela
uma beleza que tinha esquecido durante muito tempo e um sentimento adormecido
desde que ele renunciara a vida para servir aos mestres do fogo ressurgiu com
intensidade.
A noite estava fria como costumava ser e
eles permaneceram sem falar nada por mais alguns segundos; ela não tirava os
olhos dele, já ele esforçava-se para encarar a moça de frente, mas não
conseguia, não queria dar o entendimento de que estava sentindo algo por ela e
perceber que ela só estava sendo gentil por causa das coisas que ouviu o pai
contar.
_ O que um mago de verdade faz?_ Ela
perguntou num tom brincalhão.
_ Estuda.
_ O quê?_ insistiu.
_ Tudo._Ele respondeu com uma paciência
que pensou que não tivesse, a verdade era que Alam nunca conversou abertamente
com ninguém sobre seus estudos, antes de conhecer o pai de Eliana e não achou
que fosse possível falar das antigas coisas com mais ninguém.
Eliana riu e continuou disparando suas
perguntas:
_ Tudo o quê?
_ Cada qual estuda algo diferente, eu
estudava o fogo, mas alguns estudam as águas, os ventos, a terra, a luz ou as
sombras, são muitos elementos.
_ E quando o aprendizado acaba?
_Nunca; você continua estudando e
evoluindo, até que seu tutor morra ou algo extraordinário aconteça que o leve a
posição de mestre, do contrário será para sempre um aluno.
_ Não me parece uma grande carreira
profissional._Eliana comentou.
_ E não é.
_ Mas e agora o que você pretende fazer?
_ Eu só tenho uma certeza na vida agora, e
é que não quero nunca mais saber de nada disso; sinto-me tão livre como nunca
antes, parece que um grande fardo foi tirado das minhas costas. Não vou trocar
esta sensação nem por toda magia do mundo.
Eles pararam de falar por mais um tempo e
finalmente Alam olhou bem para o rosto da moça, ele não percebeu mais seus
olhos percorreram cada milímetro da face da bela jovem e Alam soube que estava
se apaixonando por ela.
_Estou confundindo as coisas._ Pensou em
voz alta.
Ela não entendeu, mas também não perguntou
nada sobre aquela afirmação; limitou-se a continuar calada; agora ambos olhavam
para o céu, sentados no gramado dos fundos.
Depois de um tempo em silêncio ele virou
para ela e perguntou:
_ Em que lugar do Rio de Janeiro você
mora?
_ Num município chamado Mesquita._ ela
disse.
Alam sorriu um pouco antes de falar:
_ Ora! Baixada fluminense.
Eliana se retraiu; pensou que ele fosse
fazer alguma piada de cunho social, mas ficou surpresa com o que ouviu.
_ Não acredito nisso! Eu realmente não
acredito nisso!_ ele disse, concluindo_ Eu também morei lá há dez anos atrás.
Eliana parou por um momento e ponderou
alguns fatos, ele disse algo que ela não escutou, e, finalmente perguntou para
ele:
_ Sabe o que eu acho de tudo isso?
_ Não.
_Acho que você, eu, meu pai e tudo mais
foi preparado por Deus de alguma forma, você não acha?
Ele meneou um pouco a cabeça da direita
para a esquerda sem saber o que dizer.
_ Acho que tudo isso não passa de
coincidência._ Ele disse.
_ “Qual é!”, Não existem coincidências,
você não acha que é um pouco demais, nos dois termos saído do mesmo lugar para
nos encontrarmos aqui; podíamos ter nos encontrado lá em Mesquita, mas não
aconteceu. Sabe como eu chamo isso, providência, é assim que chamo.
_ A forma onisciente com a qual Deus, o
Senhor, governa todas as coisas._ Alam balbuciou.
_ Pois é. _ Eliana finalmente se levantou;
disse que estava ficando com fome e ia buscar algo para comer lá na festa,
perguntou também se Alam gostaria de algo, mas ele recusou educadamente.
Com isso ela saiu e o jovem permaneceu lá
parado pensando nas palavras de sua bela anfitriã, “A forma onisciente com a
qual Deus, o Senhor, governa todas as coisas”; providência.
Além daquele pensamento outra coisa ficou
martelando na mente dele, já era um fato, que uma pequena semente de amor tinha
sido plantada no seu coração, certamente brotaria como uma flor
de tulipa; e tal sentimento estava direcionado para a bela filha de
Adalberto Ramos.
A noite prosseguiu e a festa também, o
futuro ainda guardava muitas surpresas para aquele jovem, mas a partir daquela
noite as coisas começaram a fazer um pouco mais de sentido.
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