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Mente elemental. -- Capítulo 12




A festa de boas vindas para Eliana não demorou muito para acabar, ao menos Alam não quis ficar até o fim; despediu-se dos anfitriões e da bela Eliana e em seguida voltou para a sua própria casa sem perceber que fora visto por pessoas de intenções escusas.
Ao chegar em casa ele guardou sua Mercedes e entrou rapidamente, era um final de noite e sua cabeça, embora estivesse muito melhor, mais leve, se comparado a dias atrás, ainda assim tinha muitos pensamentos soltos que o incomodavam. Como se não bastasse tudo aquilo, ele ainda tinha que suportar a imagem de Eliana em sua mente; não sabia o que fazer nem o que dizer para a moça, seus sentimentos com relação a paixões e amor foram por tanto tempo reprimidos que agora, livres, voltavam com máxima força.
Alam ficava imaginando que imagem ela tinha dele; será que ela sentia pena dele por todas as coisas que Adalberto falou a seu respeito? Ou, será que ela havia sentido o mesmo que ele quando se viram na festa, quando seus olhares se encontraram e por um momento, para Alam, tudo pareceu fazer sentido? Teria Deus movido às peças no tabuleiro universal de xadrez para que ele encontrasse aquela moça? Faria tudo parte de um grande plano divino? Eram algumas dúvidas e conjecturas  que o jovem fazia enquanto caminhava dentro de sua própria casa.
Foi ao quarto e colocou a chave do automóvel em uma mesa próximo da cama, em seguida se olhou no espelho e pareceu não se reconhecer. Era outra pessoa, na verdade estava apenas cansado e uma boa noite de sono faria tudo voltar para o lugar; uma coisa ele sabia, e era que quando se tem muitos problemas ou um problema, que seja, muito grande, a última coisa que vale a pena fazer por ele e perder noites de sono. Na verdade, perder noites de sono nunca fez com que nenhum problema ou obstáculo fosse solucionado ou vencido, pelo contrário, sempre tornou a resolução mais difícil.
Alam passou por um cômodo de sua casa o qual não tinha decidido bem o que seria, portanto, este cômodo ainda estava totalmente desarrumado, havia caixas de livros espalhados pelo chão e estantes desmontadas que ele planejava montar assim que tivesse um tempo livre; ele não sabia se tornaria aquele lugar um escritório, ou uma sala de leitura com biblioteca particular, ou ainda um sala de vídeo. Embora tivesse queimado muitas outras caixas de livros relativos ao estudo da magia, logo que se mudou para esta nova casa ele ainda guardava uma ou duas, mas não pretendia mantê-las ali, ele queimaria assim que as encontrasse no meio de toda aquela bagunça, deixaria apenas as literaturas, era um apaixonado por livros, gostava até de cheirar um livro na prateleira de uma livraria, só para sentir o cheiro de livro novo. Se bem que isso já não acontecia fazia muito tempo; ele gostava e tinha uma infinidade de títulos excelentes e pretendia manter em casa sua coleção, e agora até mesmo aumentar o acervo.
Livros como os clássicos Dom Quixote de La Mancha, uma edição histórica publicada em 1615 pelo escritor espanhol Miguel de Cervantes y Saavedra; este livro foi um presente que Alam recebeu quando visitou Madri quatro anos atrás, a influência de seu antigo mentor tinha-o feito conhecer pessoas que o presentearam com aquela raridade, mas aquele não era o único livro raro que ele tinha em casa. Outro era a grande epopéia portuguesa, Os Lusíadas, escrita por Luiz Vaz de Camões, que ele adquiriu quando esteve em Lisboa; a edição que Alam possui foi publicada no ano de 1572, portanto, é raríssima e ele a guarda com muito cuidado, outros livros como A Divina comédia de Dante Alighieri, A Ilíada de Homero, A Eneida de Virgílio e uma série de livros atribuídos a Geoffrey de Monmouth tratando das Lendas Arturianas e Bernard Cornwell também faziam parte de sua coleção, embora não em edições raras como aquelas.
Muitos outros livros davam complemento ao seu acervo, mas como fazia muito tempo que não ia às compras para aumentá-lo, logo tinha deixado de acompanhar novos títulos e novos autores que surgiram no cenário mundial, principalmente nos últimos cinco anos, pois nesse tempo ele mergulhou fundo nos objetivos da ordem e abdicou totalmente de sua vida, Alam vivia para servir a seus mestres.
Depois de ficar parado um tempo no limiar de sua provável biblioteca ele foi para a sala, ligou a televisão, viu um pouco das notícias e sem perceber acabou caindo no sono.
_Alam._ Chamou a voz na primeira vez.
Não houve resposta.
_Acorde Alam_ disse na segunda vez.
Ainda sem resposta.
A temperatura ao redor se elevou e o rapaz finalmente acordou, algo estava errado, a sala ficou muito quente e um forte cheiro pairava no ar, ele tentava negar para si mesmo, mas já sabia o que significava tudo aquilo.
_ Alam._ chamou novamente.
_Quem está aí?_ O jovem rebateu.
_Como você espera sair desta situação? Vai levar até o fim essa história de confrontar seus mestres?
Alam se levantou e olhou ao redor, não havia ninguém lá além dele, mas a voz era real e audível.
_Quem está aí? O que quer comigo?
_Os mestres vão agir, e você, por mais espetacular que seja, não poderá vencê-los, isso é demais para um homem só.
Alam começou a pensar sobre aquilo, considerou o calor na sala, pois imaginava que se tratasse de um elemental; criaturas que são a essência de um determinado elemento, no caso dele, o fogo. Mas um Elemental não é nada mais do que um espírito que não possui capacidade de se comunicar; durante muitos anos ele se debruçou sobre o estudo destas criaturas, porém agora já não queria saber de nada disso.
_ Não sei o que vou fazer_ respondeu concluindo_ Mas creio que um confronto será inevitável.
_ A ordem do fogo é a única instituição incorruptível da história dos homens, desde sua fundação passamos por todas as eras guardando segredos que pessoas comuns não teriam a capacidade de reter, estamos em todas as esferas de atuação da sociedade, comandamos nações, homens de prestígio, criamos personalidades conhecidas mundialmente e destruímos outras, somos a única luz nesse mundo de caos. Nós somos os deuses deste mundo.
Parte daquilo era algo que o próprio Alam tinha como verdade absoluta antes de passar por suas últimas experiências, mas agora não parecia fazer nenhum sentido.
A voz continuou:
_ Você conseguiu tudo o que pessoas dariam a vida para ter, não jogue fora o que você conseguiu, conheceu o mundo, pessoas, ganhou dinheiro e prestígio muito além de suas expectativas; seu brilho chegou até mesmo a ofuscar a genialidade de Donovan em alguns momentos.
Alam não queria pensar naquilo, sua vida estava se tornando muito mais simples e feliz; pensou em Eliana e em Adalberto Ramos, seu mais novo amigo, um homem simples e sábio ao mesmo tempo, talvez pela forma como cria nas coisas.
Mas Alam também não podia negar, o mundo que ele havia conhecido era fascinante, nunca houve falta de nada, era apenas uma questão de desejar, Alam foi praticamente ao topo de suas ambições; nunca quis ser um mestre do fogo, não teve a pretensão de tomar o lugar de Donovan, tudo o que ele almejava era ser um servo útil.
Alam balançou a cabeça se perguntando o que estava acontecendo, que voz estranha era aquela que falava com ele na sala de sua casa e mostrava coisas que ele já tinha decidido esquecer.
_ Pense de novo Alam. Reconsidere._ disse a voz.
_Não quero, deixe-me em paz. Quem é você?
_ Seja inteligente, por que trocar de vida e reputar como perda tudo aquilo que você conseguiu por seus próprios méritos?
_ Não sou mais a mesma pessoa, Donovan enlouqueceu, não vou tomar parte em nada disso, minhas mãos não vão ver mais sangue inocente.
_Então volte e faça-os ver o que há de errado, corrija o rumo, seja aquilo que você é, o arauto.
_Não!
Foi só nessa hora que ele percebeu que a voz estava dentro de sua cabeça, não era algo verdadeiramente audível, mas sim, sua mente, ou algo dentro dela, tentando convencê-lo a retornar às velhas práticas.
_Não!!_ Disse novamente levando as mãos à cabeça e apertando com força.
Na verdade aquilo era sim uma batalha entre Alam e Alam, mas havia uma sombra por trás tentando manipular seus pensamentos; a mente dele ficou durante muito tempo sob o peso e os dogmas da ordem vermelha, sem dúvida estava se recusando a assumir aquele novo estilo de vida, a verdade era que o jovem estava com extremo medo das mudanças que implicavam essa nova vida. Parte dele queria avidamente um recomeço e sentia que era possível deixar tudo para trás, mas uma outra parte não queria largar os velhos costumes e preferia se arriscar com Donovam, Cortez e a ordem do que se submeter a Deus.
_ Não quero pensar nisso._ ele disse e sentou no sofá ainda com as mãos na cabeça_ Não quero!
Durante as várias conversas que teve com Adalberto ramos, muitas boas palavras tinham sido semeadas em Alam e vez por outra ele se lembrava de alguma; naquele exato momento ele lembrou do que Ramos tinha falado há alguns dias:
“Vai parecer estranho, porque você é uma nova pessoa, mas sua mente, seu coração e todos os seus sentidos ainda são os velhos; lute contra eles com a única coisa que pode vencer; a fé”.
_Não volto mais para a ordem, este é minha decisão.
A voz dentro da mente dele parou de se opor, momentaneamente e as coisas pareceram voltar ao normal, exceto pelo calor intenso dentro da sala aumentando rapidamente; Ele tirou as mãos da cabeça e respirou fundo, sabia que sua mente foi doutrinada por muito tempo de forma a se tornar o que os mestre vermelhos chamavam de mente elemental, ou seja, o modo como eles subconscientemente tratavam as coisas era muito diferente de qualquer outra pessoa e uma dessas diferenças era o fato de que por vezes o subconsciente podia trazer as chamas à existência mesmo sem um comando consciente do mago. Muitas vezes, principalmente no começo de seu aprendizado ele acordava durante as noites com algo em chamas dentro do quarto, mas há tempos que isso não acontecia.
Agora Alam percebia que estava prestes a ocorrer novamente e forçou a si mesmo numa tentativa de controlar aquele fenômeno; julgando pelo calor que estava em sua sala era possível que todo o cômodo entrasse em combustão e isso era a última coisa que ele queria.
Alam não percebeu, mas ficou suado rapidamente, fechou os punhos e trincou os dentes; uma tensão percorreu seu corpo e no exato momento em que ia acontecer a combustão de todo o cômodo, ele forçou-se a pensar em si mesmo, não podia arriscar um incêndio em sua nova casa que obviamente não estava preparada para isso. O fogo que surgiria em todas as partes da sala foi focalizado em um único lugar, o próprio corpo de Alam e uma pequena explosão com ruído metálico apareceu de forma mágica lançando chamas em seu corpo. As chamas consumiram quase que instantaneamente as roupas dele e a força do encantamento o arremessou contra a parede violentamente, mas felizmente nada mais foi afetado pelo fogo que desapareceu em seguida.
Antes que ele pudesse se recuperar por completo de sua magia auto-infligida, seu telefone celular tocou várias vezes lá no quarto, ele não ia atender, mas pensou em seus novos amigos e se levantou vagarosamente. Quando finalmente pressionou a tecla na tela do aparelho, viu que a ligação vinha realmente da residência dos Ramos.
_Alô?!_ disse a palavra com todo o cuidado para não parecer que estava fazendo magias involuntárias em casa.
Mas a voz do outro lado não era a voz de Adalberto nem de Eliana nem mesmo da senhora Ramos, era uma voz conhecida e que soava muito mais medonha. Era a voz de Phyros e ele estava na casa de seus amigos. Um temor saiu da mente de Alam e percorreu todo seu corpo como um relâmpago quando ouviu seu adversário dizer:
_Se você chegar em tempo vai salvá-los do fogo, do contrário carregará mais culpa nos ombros para sempre.
Após dizer isso o telefone ficou mudo.
Alam mal podia acreditar que Donovam fosse mandar eliminar a família Ramos; os pensamentos se voltaram para Eliana e o medo cresceu dentro dele. Trocou suas roupas queimadas por outras e saiu de casa o mais rápido que pôde tirou o carro da garagem e partiu em direção ao seu destino.


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