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Conversa franca. – Capítulo 5




Dois dias se passaram e Alam ficou novamente hospedado na casa da família Ramos, não queria dar trabalho a ninguém, mas Adalberto insistira muito. Os pensamentos ainda muito desencontrados e conflitantes incomodavam o jovem a cada hora do dia e tudo o que ele podia e conseguia fazer era permanecer trancado no quarto de hospedes sem coragem para encarar seus anfitriões nos olhos.
Na primeira noite o sr. Ramos esteve com ele conversando algumas coisas sem importância apenas para que o rapaz se sentisse bem; o rapaz estava em um dilema e queria retirar o peso de seus antigos atos como arauto da ordem vermelha de sobre seus ombros, mas não sabia como; ele pensava em contar parte das coisas que vivenciara a Adalberto e ver o que ele diria, mas temia assustá-lo.
Na segunda noite Adalberto bateu na porta para tentar estreitar mais a relação de amizade que estavam construindo meio que ainda sobre alicerces frágeis.
_ Entre._ disse Alam_ A porta está aberta.
Alam estava sentado na cama repetindo o mesmo ato que fizera nos últimos dias; ele lia a pequena Bíblia que ganhara de presente, entretanto ainda não entendia muito bem o que estava escrito, o que era um verdadeiro espanto; porque se tratando de uma pessoa de grande inteligência como Alam, um jovem que estudara durante anos conceitos antigos e complexos em línguas mortas, transcritos em livros velhos e empoeirados com caligrafias e simbologias terríveis de se decifrar. Uma pessoa que possuía uma capacidade mental tão desenvolvida que era capaz de materializar um elemento primordial da natureza somente por sua força de vontade; um jovem que conversava de igual para igual qualquer assunto que fosse proposto, quer referente à política, economia, magia, história, literatura, religião e tantos outros temas sem nenhum embaraço e de forma erudita. Era realmente espantoso pelo menos para ele que não estivesse compreendendo as palavras do único livro que pensou que nunca leria.
_ Como você está? Sua leitura está boa?_ perguntava Adalberto realmente interessado em saber.
Alam fechou cuidadosamente a Bíblia e repousou-a sobre a cama.
_Estou muito melhor, mas não consigo entender o que está escrito.
Embora ambos estivessem vivendo há tempos no Canadá e falando fluentemente o idioma local, o livro estava escrito em português, língua materna dos dois.
 Adalberto perguntou:
_ Seu português está sem uso? Se quiser posso ler para você ou conseguir uma no idioma Inglês ou Francês?
Mas na verdade o português dele estava impecável, como se nunca tivesse saído do Brasil, o problema eram as implicações espirituais contidas em cada sentença de palavras.
_Não é isso, meu português está ótimo; o problema é que minha mente esta forjando coisas que não compreendo quando leio._ falou meio envergonhado.
Adalberto se aproximou um pouco mais:
_ Deixe-me ajudar._ falou recolhendo a Bíblia de cima da cama e abrindo para ler algum trecho.
Mas Alam já não aquentava mais tamanho peso na consciência e para não enlouquecer acabou despejando algumas palavras sobre o Sr. Ramos.
_ O senhor acredita em magia? _ perguntou.
Adalberto encarou o hóspede de forma séria, mas não o suficiente para assustá-lo, pois sabia que rumo a conversa tomaria a partir daquele momento.
_Sim, é claro. Respondeu.
_ Não estou falando de magia praticada por pessoas sem preparo, amadores; estou falando de domar a vontade da natureza por intermédio da força de vontade humana.
Adalberto pensou um pouco antes de responder, nunca alguém tinha feito uma pergunta como aquela antes, e na verdade ele também não havia presenciado durante a vida nenhum tipo de manifestação deste modo; muito embora, no fundo sempre soubesse que era possível.
_Repito minha resposta_ Falou firmemente_ Eu nunca vi nada disso ocorrer, mas creio que seja possível.
A partir daquele momento Alam contou-lhe com riqueza de detalhes o que tinha acontecido nos últimos encontros com Donovam e contra o Carrasco; falou-lhe sobre as casas do fogo existentes na cidade de Ottawa; falou sobre a batalha pelo supremo trono, as vertentes da ordem, a magia elemental do fogo, o aprendizado sob o qual foi submetido durante anos da vida, sobre as batalhas contra as ordens rivais; os magos do mar, do ar, da luz, dos ventos, os necromantes, as escolas menores; tudo pormenorizado. Nunca pensou que faria isso um dia, mas em pouco mais de três horas Alam discorreu sobre vários segredos dos quais era o portador; nomes de pessoas influentes não só no Canadá, mas principalmente no Brasil, na América e na Europa; as ligações políticas da ordem, as celebridades envolvidas ao redor do mundo, as formações de pequenas irmandades, os planos de expansão, a guerra pela unificação.
Ele fez uma pequena pausa e mergulhou novamente no assunto, tratando agora sobre as artes místicas, os livros antigos, as simbologias, a mente humana, a mente elemental, a mente universal, etc...
Pouco a pouco diante de Adalberto caíram as máscaras que escondiam segredos tão óbvios que seria impossível que por si só ele ou alguém descobrisse, naquela noite Alam quebrou todos os juramentos que já fizera na vida e expôs a face dos magos, mas ele sentia que sua alma estava pesada demais e se não falasse não duraria mais um dia.
_Sinto meu espírito pesado, muito pesado; acho que não há mais salvação para mim._ Disse por fim.
No seu interior, o Sr. Ramos estava ao mesmo tempo abismado e feliz; abismado porque não podia imaginar que um jovem com praticamente metade de sua idade já possuísse tamanho grau de envolvimento com entendimentos como aqueles e com magia da forma como Alam estava. E feliz porque agora seria a hora do renascimento do rapaz.
Adalberto riu afetuosamente e Alam não entendeu.
_ E se eu falar para você que é possível livrar-lhe de seu espírito pesado e de todos os pecados que você já cometeu na sua vida.
_Eu não acreditaria._ respondeu prontamente o jovem mago.
_Ora vamos; você já creu em tantas coisas na vida, não quero te empurrar dogmas religiosos, nem filosofia alguma, ao contrário, quero mostrar a saída, a Verdade; e para isso quero que acredite no que vou dizer a seguir:
_ Há muito tempo atrás, um homem foi confrontado, e para que o povo de sua nação soubesse a verdade sobre uma confraria de magos que os iludia constantemente com regras cruéis em nome de uma entidade da mesopotâmia, cujo nome era Baal. Este homem chamado Elias desafiou-os a todos.
Esta irmandade de sacerdotes exigia do povo sacrifícios de sangue e fogo, de modo que crianças eram imoladas, sendo queimadas em altares para reverenciar a este suposto deus. Esse episódio ficou conhecido como o desafio épico do Monte Carmelo; montanha na costa de Israel, de onde se pode ver o mar mediterrâneo e próximo de cidades como Haifa, Nesher e Tirat Hakarmel.
Alam Já havia estado em Israel, mas não conhecia a cidade de Haifa, pois ficara hospedado no excelente hotel Dan Panorama de Tel Aviv, praticamente de frente para o mar mediterrâneo. Alam jamais se esqueceu da suntuosidade daquele hotel. Ele sabia que as cidades eram próximas, mas nunca fora à outra. Gostara muito de Tel Aviv. Porém fez poucos trajetos ou passeios além do caminho do hotel para o aeroporto Ben Gurion.
Adalberto continuou:
_ O lugar onde este embate aconteceu é ainda hoje chamado de El-Muhraqah, que significa: “Lugar Que Recebeu Fogo”; fica localizado a sudoeste do Monte Carmelo. O desafio consistia em: Os sacerdotes do falso deus Baal aprontariam um sacrifício de um animal que deveria ser morto e preparado segundo as regras do seu culto, este animal seria colocado sobre um altar e todos os sacerdotes ali presentes invocariam seu deus pedindo que ele os concedesse fogo para incinerar o animal ofertado.
O sr. Ramos parou um minuto e sorriu divertidamente antes de continuar o relato, mas Alam ouvia a tudo muito atento.
_Eram quatrocentos e cinqüenta sacerdotes de baal pedindo que surgisse fogo sobre aquele altar para consumir o bezerro que fora colocado, mas durante horas a fio eles gritaram e nada absolutamente ocorreu. O povo da nação de Israel estava observando a tudo aquilo, e finalmente chegou à hora de Elias, fazer o que deveria ser feito; depois de preparar para si um outro bezerro ele arrumou a lenha tal como os outros sacerdotes e pôs o animal sobre a lenha, não satisfeito, ainda jogou água sobre tudo aquilo de modo que encharcou o lugar e bastou ele elevar seu pedido a Deus então do céu surgiu fogo que consumiu tanto a água, quanto a lenha e o bezerro.
Alam coçou a cabeça sem saber o que dizer, sem expressão alguma na face.
_Então você está dizendo que um homem sozinho invocou fogo quando quatrocentos e cinqüenta magos não conseguiram?
Inconscientemente Adalberto concordava meneando a cabeça; e disse:
_O que estou dizendo é que aquele que é o dono do fogo foi o que respondeu enviando o elemento.
O jovem mago estava se sentindo de certa forma confortado por ver que o senhor Ramos queria de algum jeito ajudá-lo, porém sabia que não era assim tão fácil a coisa.
_ Você diz isso porque não conhece Donovam Draek nem a ordem dos magos vermelhos._Falou o rapaz.
_ Mas conheço Deus, e só isso me basta meu jovem; o que lhe contei é a mais pura verdade, e se você, esse tal Donovam e tantos outros homens podem de alguma forma que não compreendo invocar e ou dominar o fogo como você diz, não importa o quanto vocês já tenham estudado para fazê-lo de forma artificial, porém o fogo, assim como tudo que existe neste mundo foi criado por Deus e a verdade é que aqueles que de Deus são filhos têm o poder e a autoridade sobre toda a criação, por intermédio do grande nome do Cristo.
Meio contrariado por tudo aquilo que Adalberto Ramos estava dizendo Alam não teve dúvidas, afinal já estava encrencado com a ordem e uma acusação a mais não faria diferença alguma. Iria mostrar uma simples técnica de materialização.
Pedindo que o seu anfitrião se afastasse um pouco Alam estendeu a mão com a palma voltada para cima e, concentrando seu pensamento; tornando toda a correnteza de imagens, vozes e frequência em uma fina linha que fluía de sua mente para a mente da natureza; Alam ordenou que a realidade se rasgasse e em sua mão brotasse calor.
Abismado Adalberto ramos viu o exato momento em que bem no centro da mão daquele rapaz uma labareda surgiu e bruxuleou rapidamente, depois foi sufocada e desapareceu quando o jovem fechou o punho.
Alam olhava para dentro dos olhos petrificados e maravilhados de seu mais novo amigo, mas esperava outra reação e não a que se seguiu.
 O senhor Ramos sorriu bem alto mostrando uma felicidade bastante sincera.
_ Mas que maravilha!_ ele disse._ Você tem um talento incrível.
_ Não é talento, e sim anos de estudos, muita disciplina mental e comprometimento espiritual _ rebateu, e continuou_ qualquer um pode fazer isso desde que seja iniciado no caminho do fogo e estude bastante.
Adalberto permanecia feliz.
_ Não garoto; não quero desfazer do grande sacrifício que você empreendeu estes anos todos, mas sustento; agora sei que você é a pessoa certa para combater este mal chamado Donovam, entretanto devo dizer-lhe somente mais algumas coisas...
***
_ Eu acabo de ter uma iluminação_ falou Donovam calmamente após um gole de vinho Brunello di Montalcino Riserva 1970.
A lareira estava acesa em seu escritório particular no centro da cidade, em um dos prédios mais altos; onde ficava localizada sua firma de engenharia e arquitetura. Da janela era possível avistar o magnífico hotel Fairmont Chateau Laurier com seu formato de castelo medieval em estilo gótico.
Sua mesa estava abarrotada de papéis e projetos e em frente à mesa o executivo chefe de operações da firma de engenharia de Ontário, onde Donovam Draek exerceu durante muito tempo o cargo de CEO, Diretor Geral.

Este mesmo executivo sempre quis ser tutelado por Dom Draek, que por sua vez não o considerava preparado para ser iniciado no caminho do fogo; embora fosse um excelente arquiteto e empresário, além do mais, Donovam não queria mais saber de ter alunos, no fundo ele sabia que havia esculpido o melhor dos alunos, Alam; mas sabia também que o sentimento de humanidade dentro de seu ex-discípulo o tornava fraco para os objetivos de unificação das casas e escolas de estudo da magia do fogo.

_ E então Draek?_ Perguntou o executivo engravatado sentado na macia cadeira em frente à mesa de Donovam.

O mestre continuava saboreando sua taça de vinho, e logo após degustar mais um gole falou:

_ Vou mandá-lo para uma missão; você vai fazer uma busca.

Entusiasmado o outro perguntou:

_ Em nome da ordem?

_Não. Em nome da firma.

_ Oh! É claro._ respondeu o executivo meio contrariado.

_ Use seus contatos e descubra para mim onde meu antigo discípulo se escondeu, comece pelo seu antigo domicílio e vá expandindo o raio da busca, não poupe esforços, quero essa informação o mais rápido possível.

O outro homem embora alguns anos mais velho do que Donovam, o admirava pela forma com que ele tomava as decisões, a classe com que fazia todas as coisas e por isso almejava entrar para a Ordem.

Donovam disse:

_ Vá e me impressione.

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