Antes da reunião começar, Adalberto Ramos
costumava chegar e preparar todas as coisas para que tudo estivesse em perfeita
ordem quando as pessoas que viriam assistir e aprender com seus sermões
chegassem. Costumava arrumar os bancos e se preparava previamente, colocava seu
esboço de mensagem sobre o púlpito, ao lado de sua bíblia aberta sempre na
primeira parte da mensagem e gostava de pensar a respeito das passagens que
daria para suas ovelhas.
Naquela manhã um homem chegou antes que
todos os outros, mas não fazia parte de tal congregação, era uma pessoa que
Adalberto nunca tinha visto. Sempre ficava feliz quando uma nova alma visitava
sua congregação.
Levantou-se do banco onde estava e foi
encontrar com o visitante logo que este passou pela grande porta arqueada.
_ Muito bom dia_ Disse solicitamente.
O visitante respondeu de forma tão
solicita quanto o anfitrião:
_ Muito bom dia; o senhor é o responsável
por essa igreja?
_Sim, me chamo Adalberto Ramos e sou o
responsável por essa congregação. Em que posso ajudá-lo?
_ Estou procurando um grande amigo e fui
informado de que ele agora freqüenta este belo local.
Ora, se havia alguém apropriado para saber
de qualquer um dos membros da congregação esse alguém era o Sr. Ramos.
_ Diga-me o nome da pessoa e poderei falar
se ela realmente tem vindo aqui. Conheço pessoalmente cada uma das minhas
ovelhas.
Os olhos do visitante cintilaram e o
anfitrião percebeu algo diferente, uma espécie de malícia transpareceu
momentaneamente por seus olhos.
_Estou procurando por Alam S. Plínio_
disse.
O pastor queria ter ouvido qualquer coisa
menos aquele nome, já imaginava quem poderia ser aquela pessoa parada bem na
sua frente, provavelmente um dos lacaios do antigo mentor do jovem Alam, ou
quem sabe até o próprio ex-professor do jovem; mas era incrível, aquele homem
não parecia ser tão monstruoso como Alam o tinha descrito.
_ Qual é o seu nome?_ perguntou Adalberto.
_ Ora! Perdoe-me pela falta de educação.
Me chamo Juan Martin Cortez.
Ramos pensou rápido, havia duas
possibilidades ali, a primeira era a clara tentativa de engano, o homem poderia
ser Donovam Draek e estava mentindo sobre seu nome, mas Alam também havia
falado sobre um tal Juan oriundo da Espanha e também era possível que fosse aquela
pessoa.
Adalberto não mentia e também naquela
situação usaria da verdade, pois sempre em sua vida procurou se basear na
verdade, mas tentaria ser o mais defensivo que conseguisse para não comprometer
seu jovem amigo.
_ Sim, Alam tem freqüentado a congregação
regularmente; é um excelente rapaz, gosta de aprender.
Cortez gostou da palavra de Ramos.
_Posso ficar e esperar por ele, sentarei
no último banco e tentarei aprender alguma coisa também.
Juan cria que a única forma de aprender
novas coisas era pelo método místico ao qual vinha se dedicando desde 1970
quando ainda com quinze anos morava com seus pais na comunidade espanhola da
Galiza, em uma conhecida cidade chamada Santiago de Compostela, antes de se
mudar definitivamente para Tenerife. Mas poderia facilmente ficar e esperar por
Alam sentado sem ser incomodado pelo sermão do pastor. Em sua cidade natal
todos eram muito ligados ao cristianismo, portanto Juan possuía um conhecimento
considerável da bíblia, ao contrário de Donovam que abominava aquele livro.
_ Fique à vontade, não precisa se sentar
nos últimos lugares fique na frente, ouça, preste e empreste sua atenção ao que
vai ser dito_ falou Adalberto, continuando._Mas devo avisá-lo que Alam pode não
vir para a reunião da manhã, por vezes ele chega depois e então ficamos
conversando sobre o sermão e sobre outros assuntos pertinentes a fé.
_Não tem problema, estarei feliz em ficar
mesmo assim, caso eu não o encontre aqui hoje lhe peço apenas que entregue isso
para ele.
Juan retirou do bolso um pequeno cartão
contendo seu nome, um telefone para contato e endereço eletrônico. Em seguida
disse:
_ Não quero mais tomar seu tempo vou me
sentar e esperar, não se prenda a mim, volte a seus afazeres.
Juan estendeu a mão direita para Ramos que
retribuiu o aperto. Momentaneamente Adalberto percebeu que sem dúvida estava
diante de um homem que se encaixava nas descrições que Alam havia feito,
tratava-se de um mago do fogo em carne e osso. Adalberto não sabia como sabia
daquilo, ele apenas sabia.
Juan Cortez fez força para não passar a
sensação que sentiu quando apertou a mão do responsável por aquela pequena
congregação. Costumava ter pressentimentos sobre as pessoas, às vezes sabia até
quando essas mesmas pessoas estudavam magia, mas no caso de Adalberto Ramos
algo muito diferente aconteceu. A sensação que teve foi como se ele estivesse
representando o fogo enquanto o outro homem representava outra coisa.
Para um mago, a humanidade se divide em
dois grupos, aqueles que possuem sua chama interior acesa, e isso só pode ser
feito por meio do estudo mágico; e aqueles que não possuem chama alguma. Porém,
era como se aquele homem que agora ajudava Alam tivesse um brilho que Cortez
nunca vira antes, diferente de tudo o que ele já vira ou lera com relação ao
estudo das auras metafísicas. Adalberto Ramos possuía luz.
As outras pessoas chegaram e tomaram
acento gradativamente, quando o lugar encheu de gente a reunião começou, Juan
ficou o tempo todo prestando atenção no líder da congregação, nos seus atos, no
modo como falava, como cantava; em fim, em tudo que ele fazia tentando achar
uma explicação para suas sensações. A certa altura uma senhora pediu a ele que
a ajudasse, pois não estava conseguindo encontrar uma referência bíblica.
Juan prontamente atendeu ao pedido da doce
senhora idosa, ajudou e acompanhou toda a leitura juntamente com ela.
De cima do altar, atrás do púlpito,
Adalberto Ramos conduzia a reunião da forma como costumava ser, sempre com
muita reverência e sabedoria; junto com a congregação ele leu alguns trechos da
bíblia e discorreu acerca das passagens, sempre numa forma bem simples e
prática, mostrando realmente como poderiam utilizar os conhecimentos que
estavam aprendendo ali, para suas vidas.
Vez por outra os olhares de Juan se
cruzavam com o de Ramos e ambos desviavam a visão, mas tanto um quanto o outro
já haviam se percebido mutuamente. O líder da congregação sabia que deveria
preparar o jovem Alam para uma possível investida de seus inimigos magos, mas
começava a pensar também que deveria ele próprio se preparar para algum tipo de
intimidação, não sabia o motivo daquele pensamento, mas algo naquele tal Cortez
não parecia muito bom, algo estava escondido.
Juan, por sua vez, sentira uma estranha
sensação que não o deixava, não sabia o que poderia ser, mas ao ver Adalberto
sobre o altar falando e cantando para toda uma congregação de pessoas, cerca de
duzentas, com as bíblias nas mãos, felizes, contando histórias de como suas
vidas estavam sendo ajudadas por Deus; o mago logo percebeu que todo aquele
ambiente poderia fazer mal às suas pretensões de usar Alam. Juan não ignorava a
existência de Deus, ao contrário de Donovam, que fazia questão de negar o
Senhor da bíblia; e, justamente por isso ele sabia que se Alam realmente
chegasse a conhecer aquele que era chamado de o SENHOR dos exércitos, nunca
mais os magos vermelhos teriam o jovem promissor arauto de volta.
No fim da reunião, as pessoas se despediam
umas das outras, aparentemente todas elas nutriam uma relação muito boa entre
si, muito diferente do meio no qual Cortez vivia, a ordem era composta de
muitas pessoas, mas na verdade não havia uma camaradagem assim tão grande entre
os membros, tampouco um sentimento de unidade era nutrido por eles; é claro que
as pessoas mais chegadas a cada mago também possuíam afinidade no seu pequeno
raio de conhecimento, mas eram células, cujo único objetivo era ultrapassar
outras células e tomar os melhores lugares. Só o que importava era galgar os
lugares de honra, tal como as cadeiras de destaque dos vulcões mais antigos.
As pessoas de fora da ordem que tinham
algum contato com um mago, costumavam tratá-los com toda a reverência, mas
estes eram poucos.
Juan se aproximou de Adalberto e
estendendo a mão mais uma vez disse:
_ Gostei bastante da reunião senhor Ramos,
mesmo Alam não tendo aparecido, foi muito bom realmente.
Ramos novamente retribuiu o aperto de mão
com um sorriso sincero no rosto.
_ Gostaria que o senhor pudesse nos
visitar mais vezes Sr.Cortez; esta congregação recebe muito bem aos novos
membros como Alam ou aos visitantes ilustres como o senhor._disse.
Ora, Juan não disse o que fazia na vida
como poderia ser considerado ilustre por um homem que não o conhecia?
_ Não sou uma pessoa ilustre_ falou o mago
tentando parecer constrangido.
A resposta de Ramos foi algo que ele não
esperava.
_ Todos são ilustres aqui Sr. Cortez, é
isso que o livro sagrado nos ensina; todas as pessoas têm um grande valor para
Deus e para a sociedade, apenas não sabem disso.
O mago começou a se retirar, foi
caminhando lentamente em direção à porta grande e arqueada enquanto falava.
_É, quem sabe eu não retorne aqui,
gostaria de ter uma conversa mais informal com o senhor acerca do seu livro
sagrado.
Acenando Ramos disse:
_ Espero realmente que você retorne.
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